A minha vizinha de baixo cheira mal. Em mais do que um sentido.
Não se trata apenas de uma falta de higiene pessoal. Isso seria estatisticamente normal e passaria facilmente despercebido nos transportes públicos.
O problema da minha vizinha é que ela tresanda a um mistério sujo e mesquinho, daqueles que as almas sinuosas fabricam quando a vida é vazia demais.
Para a descrever fisicamente é mais fácil começar por imaginar um homem. Um homem feio. Um homem feio, baixinho, gordo e a perder cabelo à frente. Acrescente-se um peito disforme e que começa debaixo dos sovacos, uns óculos à Mário Crespo nos anos 80, os dentes do Austin Powers e temos o retrato fiel da minha vizinha.
Vive sozinha e trabalha na Função Pública, num departamento obscuro onde certamente terá muito ainda que carimbar até ao fim dos seus dias, e faz as manhãs de Sábado na tabacaria do bairro para arredondar o fim do mês e ouvir em primeira mão as últimas intrigas da vizinhança. E certamente espalhar as suas.
A minha vizinha tem a idade incerta de quem deixou de cantar os parabéns por não ver nisso grandes motivos para festejar, uma idade que posso com alguma segurança situar algures entre os 30 e os 50 anos. Umas quantas décadas a cuidar dos pais doentes na sua casa da Estrela, uma vida humilde, uma pobreza amargada por ver o seu bairro recuperado e ter agora que suportar a proximidade de casais novos com algum dinheiro, exibindo ostensivamente a sua felicidade e as suas crianças pequenas, sorrisos que ela sempre invejou.
Até há bem pouco tempo, tinha por companhia um cão que ladrava incessantemente atrás da porta fosse a que horas fosse e deixava um cheiro a pêlos nas escadas da entrada, mas eu até encarava tudo isso desportivamente. Sempre gostei de cães, e deste só conseguia sentir pena. Provavelmente ladrava para o virem salvar, mas a morte levou-o primeiro. Paz à tua alma, Spencer.
A casa dela, pelo que pude entrever à soleira da porta, é um covil sombrio cheio de bonecas, sinais de uma solidão acelerada (às vezes oiço-a a falar sozinha, palavrões até). Uma colecção de bonecas de cerâmica, de olhos fixos de vidro e pestanas longas, com folhos, o cenário perfeito para um filme de terror série B.
...mas tudo isto me passaria ao lado, entre os cordiais “bom dia” e “boa tarde”, não fosse o incidente do respiradouro. Um conflito transfronteiriço entre condóminos, de contornos longos e detalhes maçadores, em que motivada por uma inveja mesquinha a minha vizinha me partiu uma estrutura de madeira que protegia as janelas do respiradouro do pátio.
Até aí inofensiva, a minha vizinha demonstrou da pior forma uma total falta de civismo, de educação, das mais elementares regras de convivência. Ou dito de uma outra forma:
Helena, seu bicho cobarde e rasteiro, escória da humanidade, vai morrer longe e leva a infelicidade contigo!
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6 comments:
Morte à Helena que nós não aceitamos pessoas radicais. MORTE!!
Morte era demasiado bom... Vamos pegar na Helena e repatria-la para a Damaia... aí queria o Inspector Serra ver se já se armava em esperta!
De qualquer forma espero que já tenha um Plano B, mais realista, para a castigar!
Se lhe estiver a faltar imaginação fale aqui com o Serra.
Aquele abraço,
Serra
Espero nunca vir a ser uma Helena, apesar do "never say never", até por que teria de mudar de sexo...sendo certo que a realidade social, cultural, urbana apresentada é confrangedoramente má.
Como a mediocridade invadiu já muitas esferas da via colectiva e individual, banalizou-se...força Johnnie,desanca a mulher, algum povo está contigo!!!
CINCO MINUTOS DE SILÊNCIO NACIONAL PELO SPENCER,EM TODOS OS CONCERTOS, FESTAS, JOGOS, SESSÕES DE PROPAGANDA POLÍTICA, JANTARES DE 30 ANIOS DE CURSO E OUTROS QUE TAIS A CELEBRAR NOS PRÓXIMOS SETE DIAS.
Ah, ah, lindo Blue Dog!
Cinco minutos de silêncio então, pelas almas cinzentas deste mundo e pelos seus cães que não têm culpa nenhuma.
Nas sessões de propaganda política, alargaria os 5 minutos para 2 horas de silêncio ou todo o tempo entre o jantar e o concerto do João Pedro Pais. Pensando bem incluíria também o concerto do João Pedro Pais no tributo de silêncio.
Estimado Inspector, a Damaia também não tem culpa. Não agravemos a injustiça social dos marginalizados.
aí é que se engana, a Damaia TEM culpa, não sei de quê, mas tem! quanto aos minutos de silêncio concordo com a do JJPais.
"A pedido da audiência o nosso caro amigo João Pedro Pais, que muito nos honra com a sua presença no jantar anual doa Amigos da Sesta, vai cantar "Serenata a Marcel Marceau"....(silêncio)...
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