Há algum tempo que não escrevo no blog. Não por preguiça, ou falta de entusiasmo. Apenas falta de tempo, por um projecto que me ocupou o último ano e que me ocupará os próximos 8 meses... talvez a vida inteira.
Vou parar, para viajar. Oito meses para dar a volta ao mundo, para ter a oportunidade de vê-lo com os meus próprios olhos, com tempo para mais do que apenas o descanso ocasional das férias. Tempo para que possa absorver, dar e receber em cada lugar, voltar diferente também, tempo para uma viagem que me deixe marcas e a certeza de que tudo fiz para merecer o tempo que me é dado.
A partir de 16 de Abril, podem acompanhar-me no blog
pararparaviajar.blogspot.com
Saturday, April 08, 2006
Tuesday, February 07, 2006
O Regresso de Zorro
As mulheres compram roupa da mesma forma que procuram o homem da sua vida. Reparam nela, trocam olhares. Experimentam, mas não têm a certeza, vêem-na uns dias depois. Contam umas às outras, ando a namorar uma camisola. Os homens, claro, não têm pachorra para este ritual de aproximação, é tudo muito mais imediato e à primeira vista, vêem, experimentam, gostam, e se conseguirem levam-na para casa.
Os homens não gostam de ir às compras, ou pelo menos têm o bom senso de nunca o admitir. Mas a verdade é que gostamos de roupa, apesar do nosso vocabulário limitado não permitir que façamos realmente a distinção entre um pullover e uma sweater. Chamamos “kit” ao nosso conjunto preferido, porque tem muito mais estilo e faz-nos pensar que estamos a falar de mecânica. Temos a nossa t-shirt da sorte, a que insistimos em vestir vezes sem conta apesar de nunca mais nos ter dado sorte desde aquele Verão de 93. Golden Boy.
Como a generalidade dos psicólogos, acredito que a maioria dos nossos comportamentos são vestígios de um comportamento que tínhamos em crianças. Nos homens é particularmente fácil fazer essa ligação à infância, até porque a maioria de nós ainda vive nela. Um homem sabe imediatamente se gosta de uma peça de roupa quando a veste e se consegue imaginar dentro do fato do Zorro, quando era miúdo. É o teste definitivo. A roupa certa eleva-nos a autoconfiança ao ponto de nos tornar num vingador de capa e espada, capaz de fazer frente aos porteiros do Lux ou insultar implacavelmente qualquer taxista que se atravesse à nossa frente.
Os homens não gostam de ir às compras, ou pelo menos têm o bom senso de nunca o admitir. Mas a verdade é que gostamos de roupa, apesar do nosso vocabulário limitado não permitir que façamos realmente a distinção entre um pullover e uma sweater. Chamamos “kit” ao nosso conjunto preferido, porque tem muito mais estilo e faz-nos pensar que estamos a falar de mecânica. Temos a nossa t-shirt da sorte, a que insistimos em vestir vezes sem conta apesar de nunca mais nos ter dado sorte desde aquele Verão de 93. Golden Boy.
Como a generalidade dos psicólogos, acredito que a maioria dos nossos comportamentos são vestígios de um comportamento que tínhamos em crianças. Nos homens é particularmente fácil fazer essa ligação à infância, até porque a maioria de nós ainda vive nela. Um homem sabe imediatamente se gosta de uma peça de roupa quando a veste e se consegue imaginar dentro do fato do Zorro, quando era miúdo. É o teste definitivo. A roupa certa eleva-nos a autoconfiança ao ponto de nos tornar num vingador de capa e espada, capaz de fazer frente aos porteiros do Lux ou insultar implacavelmente qualquer taxista que se atravesse à nossa frente.
Thursday, February 02, 2006
Mário Crespo, um Tributo
O Mário Crespo é a Sophia Loren da televisão portuguesa. Soube envelhecer sem se tornar um vestígio televisivo dos anos oitenta, imune à júlioisidrisação que atacou todos os outros apresentadores do seu tempo, que acabaram a apresentar o sorteio da Lotaria Nacional ou a anunciar trens de cozinha no TV Shop. Eládio Clímaco, Luís Pereira de Sousa, Serenella Andrade. Se tivessem partido, como o Carlos Paião ou o António Variações, todos os lembrariam com saudade. Continuando, são como aquelas fotografias antigas de quando éramos bimbos, que preferimos esconder no fundo da gaveta.
O Mário Crespo não lê as notícias, aliás raramente olha para o papel ou para o teleponto. Talvez seja mais consequência da miopia que estilo jornalístico, mas não deixa de ter o seu charme. Ele conta-nos uma história, devagar, docemente, sem pressa de chegar ao fim, pedindo licença para nos dar as notícias com as palavras dele. Se estivermos distraídos, ouvindo-o ao longe parece que subitamente Israel fez a paz com os palestinianos e que foi descoberta uma vacina para a Sida.
A apresentar o 60 Minutes, sente-se a sua paixão pela profundidade das notícias, pela investigação, pela verdade, como se tivesse estado lá no terreno e preparado exaustivamente todas as perguntas a fazer. Ele sabe do que fala. Mesmo que faça só uns trechos de ligação entre as reportagens da CBS, cumpre o papel com a dignidade que se impõe ao serviço cívico, diligente, sóbrio, eficaz.
Uma das grandes qualidades do Mário Crespo é a simplicidade de não precisar de mais do que dois nomes para se afirmar. Rodrigo Guedes de Carvalho, José Rodrigues dos Santos, José Alberto Carvalho, Fátima Campos Ferreira, Alberta Marques Fernandes. Que raio, até a Judite Sousa insiste em ser Judite de Sousa!
O Mário Crespo é o velho Panoramix das histórias do Asterix, o druida, o sábio, guardião da sua tribo. O nosso Walter Cronkite, Tom Brokaw ou Peter Jennings. Uma âncora da televisão portuguesa, um refúgio da histeria sensacionalista dos tempos, que pode não ter sempre as melhores notícias para nos dar, mas estará sempre lá para que possamos compreender e aceitar um pouco melhor o mundo em que vivemos, todos os dias.
O Mário Crespo não lê as notícias, aliás raramente olha para o papel ou para o teleponto. Talvez seja mais consequência da miopia que estilo jornalístico, mas não deixa de ter o seu charme. Ele conta-nos uma história, devagar, docemente, sem pressa de chegar ao fim, pedindo licença para nos dar as notícias com as palavras dele. Se estivermos distraídos, ouvindo-o ao longe parece que subitamente Israel fez a paz com os palestinianos e que foi descoberta uma vacina para a Sida.
A apresentar o 60 Minutes, sente-se a sua paixão pela profundidade das notícias, pela investigação, pela verdade, como se tivesse estado lá no terreno e preparado exaustivamente todas as perguntas a fazer. Ele sabe do que fala. Mesmo que faça só uns trechos de ligação entre as reportagens da CBS, cumpre o papel com a dignidade que se impõe ao serviço cívico, diligente, sóbrio, eficaz.
Uma das grandes qualidades do Mário Crespo é a simplicidade de não precisar de mais do que dois nomes para se afirmar. Rodrigo Guedes de Carvalho, José Rodrigues dos Santos, José Alberto Carvalho, Fátima Campos Ferreira, Alberta Marques Fernandes. Que raio, até a Judite Sousa insiste em ser Judite de Sousa!
O Mário Crespo é o velho Panoramix das histórias do Asterix, o druida, o sábio, guardião da sua tribo. O nosso Walter Cronkite, Tom Brokaw ou Peter Jennings. Uma âncora da televisão portuguesa, um refúgio da histeria sensacionalista dos tempos, que pode não ter sempre as melhores notícias para nos dar, mas estará sempre lá para que possamos compreender e aceitar um pouco melhor o mundo em que vivemos, todos os dias.
Tuesday, January 31, 2006
Excentricidades
Eu não acredito no euromilhões. Não conheço ninguém que alguma vez tenha ganho sequer mais do que o 5º ou 6º prémio, pouco mais que vinte euros. Acho mesmo que nunca ninguém ganha o jackpot do euromilhões. Admito que o esquema está bem feito, bem publicitado, afinal a chave secreta parece estar todas as semanas à nossa frente, basta encontrarmos o caminho certo entre a caneta e o painel de números. Mas não, a mim não me enganam, o euromilhões é um embuste.
183 milhões de euros. Fiz as contas, e a não ser que tenha um valente aumento salarial na minha próxima avaliação de desempenho, para acumular a mesma quantia vou ter que trabalhar intensamente durante os próximos 7625 anos. Incluindo fins-de-semana.
É disto que o meu povo gosta. O entusiasmo desenfreado que se gera antes dos jackpots do euromilhões é a prova de que nunca ninguém está satisfeito com o que tem. Quando o jackpot são 73 milhões de euros, é ver a corrida aos balcões do euromilhões, filas intermináveis à hora do almoço e às sete da tarde de sexta-feira, colegas de escritórios a fazer poules de apostas, um industrial de Miranda do Douro a gastar cinco mil contos em cruzinhas e a rir-se bacocamente para a câmara da TVI enquanto dá calduços ao puto. Na semana seguinte, foi-se o prémio para a Irlanda, o primeiro prémio passa para 10 milhões e já ninguém liga. “Pois, o que me fazia mesmo jeito eram os 73 milhões de euros para dar uma volta à minha vida, agora 10 milhões, menina, oh isso vai-se num instante”. Pois sim, eu se ganhasse 10 milhões também não mudava a minha vida e continuava a ir na Vimeca para o meu T1 no Barreiro.
O euromilhões é um bilhete dourado ao estilo d’ “A Ilha”, um gigantesco farol construído para manter uma certa ordem e sanidade mental, acenando a todos a possibilidade real de nunca mais termos de trabalhar. Uma réstia de esperança. Uma forma de nunca nos habituarmos à ideia de ter que acordar cedo aos dias de semana, ao conceito de que tudo na nossa vida depende do esforço que pomos nas coisas. E é por isso que o euromilhões é um sucesso enorme em Portugal, não há português que não prefira depositar a sua sorte no jogo das panelas, na raspadinha, totoloto ou no jogo do galo do que na ideia de trabalhar para se sustentar.
Vão trabalhar, malandros!
183 milhões de euros. Fiz as contas, e a não ser que tenha um valente aumento salarial na minha próxima avaliação de desempenho, para acumular a mesma quantia vou ter que trabalhar intensamente durante os próximos 7625 anos. Incluindo fins-de-semana.
É disto que o meu povo gosta. O entusiasmo desenfreado que se gera antes dos jackpots do euromilhões é a prova de que nunca ninguém está satisfeito com o que tem. Quando o jackpot são 73 milhões de euros, é ver a corrida aos balcões do euromilhões, filas intermináveis à hora do almoço e às sete da tarde de sexta-feira, colegas de escritórios a fazer poules de apostas, um industrial de Miranda do Douro a gastar cinco mil contos em cruzinhas e a rir-se bacocamente para a câmara da TVI enquanto dá calduços ao puto. Na semana seguinte, foi-se o prémio para a Irlanda, o primeiro prémio passa para 10 milhões e já ninguém liga. “Pois, o que me fazia mesmo jeito eram os 73 milhões de euros para dar uma volta à minha vida, agora 10 milhões, menina, oh isso vai-se num instante”. Pois sim, eu se ganhasse 10 milhões também não mudava a minha vida e continuava a ir na Vimeca para o meu T1 no Barreiro.
O euromilhões é um bilhete dourado ao estilo d’ “A Ilha”, um gigantesco farol construído para manter uma certa ordem e sanidade mental, acenando a todos a possibilidade real de nunca mais termos de trabalhar. Uma réstia de esperança. Uma forma de nunca nos habituarmos à ideia de ter que acordar cedo aos dias de semana, ao conceito de que tudo na nossa vida depende do esforço que pomos nas coisas. E é por isso que o euromilhões é um sucesso enorme em Portugal, não há português que não prefira depositar a sua sorte no jogo das panelas, na raspadinha, totoloto ou no jogo do galo do que na ideia de trabalhar para se sustentar.
Vão trabalhar, malandros!
Monday, January 30, 2006
A Vida antes da morte
A ideia da morte incomoda-me. Para além da questão metafísica, ou do pequeno calafrio que me provoca aquela possibilidade de nunca mais voltar a existir, o que me incomoda é todo o ritual. O verdadeiro problema com a morte é que é a coisa mais mórbida que há.
A morte dos comuns não tem nenhum sentido estético, nenhuma nobreza no modo como se entrega um corpo à terra. O caixão solene, uma fotografia demasiado recente, a retroescavadora no cemitério, as covas já abertas para a próxima dezena que está para chegar, as palavras fúnebres, mortuárias, funerárias. Tudo rima com defunto e finado, beatas e carpideiras. É uma cerimónia de dor, de angústia, uma despedida cinzenta pensada para amplificar a tristeza dos que ficam, esquecendo quem parte. Falta alma aos funerais.
Mário de Sá Carneiro dizia: “quando morrer, chamem palhaços e acrobatas”. Essa seria a única forma de celebrar condignamente a partida de alguém. Com a sua música preferida, os seus melhores momentos, as fotografias de férias e de infância, as anedotas que contava, o modo como se ria. Uma despedida alegre que celebrasse também a vida, feita das imagens e palavras que são muito mais eternas que nós.
A morte dos comuns não tem nenhum sentido estético, nenhuma nobreza no modo como se entrega um corpo à terra. O caixão solene, uma fotografia demasiado recente, a retroescavadora no cemitério, as covas já abertas para a próxima dezena que está para chegar, as palavras fúnebres, mortuárias, funerárias. Tudo rima com defunto e finado, beatas e carpideiras. É uma cerimónia de dor, de angústia, uma despedida cinzenta pensada para amplificar a tristeza dos que ficam, esquecendo quem parte. Falta alma aos funerais.
Mário de Sá Carneiro dizia: “quando morrer, chamem palhaços e acrobatas”. Essa seria a única forma de celebrar condignamente a partida de alguém. Com a sua música preferida, os seus melhores momentos, as fotografias de férias e de infância, as anedotas que contava, o modo como se ria. Uma despedida alegre que celebrasse também a vida, feita das imagens e palavras que são muito mais eternas que nós.
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