Tuesday, November 29, 2005

Joyeux Noël

A Fnac associou-se à AMI para uma iniciativa de solidariedade, no mínimo, invulgar. De 1 a 24 de Dezembro, por cada voluntário que “responder ao apelo” e se inscrever para trabalhar a fazer embrulhos de Natal, a FNAC fará um donativo à AMI.

Andei a debater-me internamente sobre o mérito desta iniciativa, que pode ser vista por alguns como inovadora e plena de oportunidade. Afinal a maioria das pessoas têm pouca disponibilidade para um voluntariado que implique envolver-se no terreno com a pobreza, a miséria, a exclusão social. Assim, dão parte do seu tempo a uma causa nobre passando algumas horas a embrulhar presentes numa loja Fnac e ajudam indirectamente a AMI a recolher donativos.

Parto do princípio que a Fnac é uma pessoa de bem e gastará o mesmo dinheiro em donativos para a AMI que gastou o ano passado contratando trabalhadores temporários, mesmo descontando o benefício fiscal que recebem por apoiar uma instituição de apoio social.

É uma feliz coincidência de vontades em que todos ganham: a Fnac, a AMI que recolhe donativos e os voluntários pelo mérito de darem o seu tempo por uma causa justa.

Mas se isto é assim tão louvável porque é que me dá a volta ao estômago? Porque é que isto me soa mal?

É que ser voluntário para embrulhar presentes de Natal faz-me tanto sentido como um vegan trabalhar a cortar picanha no Chimarrão. Soa-me estranho o conflito de interesses. Uma causa nobre a reboque da fúria consumista do Natal. Dinheiro bem gasto Vs dinheiro deitado à rua. Um quadro que um olhar cínico descreveria como a celebração do materialismo da época, alimentado - quase desculpabilizado - por uma acção de solidariedade.

A história de uma sociedade desmesuradamente consumista a gastar dinheiro que não tem em presentes que não gosta de dar, enquanto simpáticos voluntários se encarregam de os embrulhar a troco de umas migalhas.

Jusqu’ici, tout va bien...

1 comment:

Bluedog said...

Concordo inteiramente com a perspectiva sugerida: trata-se pura e simplesmente de uma vergonhosa e despudorada campanha de conseguir mão-de-obra de borla para a FNAC embrulhar presentes de Natal - quanto representam as vendas de Natal nas vendas anuais da empresa ? - sob a capa do voluntariado solidário com os POBRES deste Mundo.

"En passant" essa do voluntariado também já me vai fazendo cócegas, desde que ouvi dois "funcionários" (pagos a peso de ouro) do PAM-Programa Alimentar Mundial falar sobre o assunto no bar de um hotel em Luanda. Tadinhos, que pena que eu tenho dos meninos !