A Fnac associou-se à AMI para uma iniciativa de solidariedade, no mínimo, invulgar. De 1 a 24 de Dezembro, por cada voluntário que “responder ao apelo” e se inscrever para trabalhar a fazer embrulhos de Natal, a FNAC fará um donativo à AMI.
Andei a debater-me internamente sobre o mérito desta iniciativa, que pode ser vista por alguns como inovadora e plena de oportunidade. Afinal a maioria das pessoas têm pouca disponibilidade para um voluntariado que implique envolver-se no terreno com a pobreza, a miséria, a exclusão social. Assim, dão parte do seu tempo a uma causa nobre passando algumas horas a embrulhar presentes numa loja Fnac e ajudam indirectamente a AMI a recolher donativos.
Parto do princípio que a Fnac é uma pessoa de bem e gastará o mesmo dinheiro em donativos para a AMI que gastou o ano passado contratando trabalhadores temporários, mesmo descontando o benefício fiscal que recebem por apoiar uma instituição de apoio social.
É uma feliz coincidência de vontades em que todos ganham: a Fnac, a AMI que recolhe donativos e os voluntários pelo mérito de darem o seu tempo por uma causa justa.
Mas se isto é assim tão louvável porque é que me dá a volta ao estômago? Porque é que isto me soa mal?
É que ser voluntário para embrulhar presentes de Natal faz-me tanto sentido como um vegan trabalhar a cortar picanha no Chimarrão. Soa-me estranho o conflito de interesses. Uma causa nobre a reboque da fúria consumista do Natal. Dinheiro bem gasto Vs dinheiro deitado à rua. Um quadro que um olhar cínico descreveria como a celebração do materialismo da época, alimentado - quase desculpabilizado - por uma acção de solidariedade.
A história de uma sociedade desmesuradamente consumista a gastar dinheiro que não tem em presentes que não gosta de dar, enquanto simpáticos voluntários se encarregam de os embrulhar a troco de umas migalhas.
Jusqu’ici, tout va bien...
Tuesday, November 29, 2005
Wednesday, November 23, 2005
Exercise your Music Muscle
Este anúncio da Virgin Digital é uma daquelas campanhas difíceis de descodificar. E por isso é que é brilhante, obrigando-nos a ficar horas a olhar para o anúncio, em vez dos habituais dois ou três segundos.
O desafio que nos lançam é "será que vocês percebem tanto de música como nós?". Na imagem estão escondidos nomes de bandas como os Rolling Stones, U2, etc. Dão-se alvíssaras a quem encontrar mais de cinquenta...
Monday, November 21, 2005
29
Fiz anos este Sábado. Vinte e nove. Não há nada de bom ou mau nisso, apenas um número diferente, que significa apenas mais um, e menos um também.
Há muitos anos perdi a fé na ideia da imortalidade, aquela ilusão de infância de que um dia, ainda no nosso tempo, a ciência encontrará uma cura para a morte. Procurei em Deus e no Homem, mas em nenhum encontrei conforto para o desassossego que me causava a ideia da morte. Em todas as ocasiões que a enfrentei desiludiu-me sempre.
Aos 29, talvez a juventude me comece a faltar e ainda a maturidade não tenha chegado para o compensar. Mas conheço já algumas das coisas da vida e escrevo os primeiros esboços da minha própria filosofia. Não acredito em viver cada dia como se fosse o último, essa fantasia adolescente que só se concretiza numas quantas noites de copos, mas que nunca chega a modo de vida. Amanhã acordamos de novo, as costas voltadas para o despertador, e voltamos todos para o escritório.
Acredito antes em viver esta vida como se fosse só uma. Esquecemo-nos demasiadas vezes que é só isto, e é tudo isto. Não há prolongamentos ou segundas oportunidades, e talvez esteja aí a beleza. Tudo o que é escasso é um pouco mais belo, um fogo de artifício, uma vela, o calor de uma lareira. Todos se recusam a ser cinza, e são sublimes no esplendor a que se entregam sem renúncia.
Anoto cá dentro todas as palavras que me aquecem e uso-as como cobertores sobre quem amo. Descalço a rotina sempre que posso. Acordo e decido continuar um sonho, porque nenhum risco é maior que o de nunca nos cumprirmos.
Vou procurar o velho paraíso e percorrer o mundo para tentar sentir um pouco do seu tamanho, encontrá-lo talvez entre os mares matinais do Índico e um entardecer estrelado no deserto de Atacama. A ti que me acompanhas nesta e noutra viagem, continuarei a dizer todos os dias que te amo, sempre que me apetecer, simplesmente porque o sinto e sinto cada vez mais.
Talvez um dia me vá embora, mas será sem arrependimentos. Tenho agora vinte e nove anos, mais um, e menos um também. Não importa, afinal há quem nunca comece a viver sequer.
Há muitos anos perdi a fé na ideia da imortalidade, aquela ilusão de infância de que um dia, ainda no nosso tempo, a ciência encontrará uma cura para a morte. Procurei em Deus e no Homem, mas em nenhum encontrei conforto para o desassossego que me causava a ideia da morte. Em todas as ocasiões que a enfrentei desiludiu-me sempre.
Aos 29, talvez a juventude me comece a faltar e ainda a maturidade não tenha chegado para o compensar. Mas conheço já algumas das coisas da vida e escrevo os primeiros esboços da minha própria filosofia. Não acredito em viver cada dia como se fosse o último, essa fantasia adolescente que só se concretiza numas quantas noites de copos, mas que nunca chega a modo de vida. Amanhã acordamos de novo, as costas voltadas para o despertador, e voltamos todos para o escritório.
Acredito antes em viver esta vida como se fosse só uma. Esquecemo-nos demasiadas vezes que é só isto, e é tudo isto. Não há prolongamentos ou segundas oportunidades, e talvez esteja aí a beleza. Tudo o que é escasso é um pouco mais belo, um fogo de artifício, uma vela, o calor de uma lareira. Todos se recusam a ser cinza, e são sublimes no esplendor a que se entregam sem renúncia.
Anoto cá dentro todas as palavras que me aquecem e uso-as como cobertores sobre quem amo. Descalço a rotina sempre que posso. Acordo e decido continuar um sonho, porque nenhum risco é maior que o de nunca nos cumprirmos.
Vou procurar o velho paraíso e percorrer o mundo para tentar sentir um pouco do seu tamanho, encontrá-lo talvez entre os mares matinais do Índico e um entardecer estrelado no deserto de Atacama. A ti que me acompanhas nesta e noutra viagem, continuarei a dizer todos os dias que te amo, sempre que me apetecer, simplesmente porque o sinto e sinto cada vez mais.
Talvez um dia me vá embora, mas será sem arrependimentos. Tenho agora vinte e nove anos, mais um, e menos um também. Não importa, afinal há quem nunca comece a viver sequer.
Wednesday, November 02, 2005
Vende-se, porra!
O direito é, para a maioria dos povos, um conjunto organizado de leis que rege a convivência em sociedade. Para os portugueses, é uma caça ao tesouro. Basta encontrar uma falha ou um atalho para ganhar o grande prémio. No fundo, os portugueses têm uma aptidão inata para furar o esquema.
Desde que me lembro, vejo carros espalhados pela cidade com folhas A4 coladas na janela com mensagens misteriosas e indirectas, normalmente acompanhadas de um número de telefone.
“Informa”
“Trata”
“Como novo”
“Bom estado”
“Um dono”
Esta é a linguagem de uma sociedade secreta que vive na clandestinidade, proibida de vender, esses donos de Opel Kadett, Fiat 127 e Citroën Visa por todo o país que procuram apenas uma oportunidade de melhorar a sua vida.
Segundo se diz, existe uma lei que proíbe que se ponha um carro à venda no meio da rua. Naturalmente, nada que impeça um português de vender o que bem quiser onde bem lhe apetecer. A proibição apela ao sindicalista em cada um de nós, aguça-nos a curiosidade e refina a imaginação.
Desde então, ninguém põe simplesmente o carro “à venda”, em vez disso põem o carro a tratar, ou dão informações sobre o carro. Às vezes apetece-me responder a um desses anúncios e pedir informações: que tempo vai fazer amanhã, onde fica a Rua do Rosário, qual é o número de telefone da Leitaria Saudade.
A minha teoria é que tudo isto é um boato que alguém lançou há muito tempo, e que hoje já ninguém tem coragem de pôr em causa. Por mim, tudo bem. Podemos continuar a brincar aos adultos, sempre ajuda o tempo a passar.
Desde que me lembro, vejo carros espalhados pela cidade com folhas A4 coladas na janela com mensagens misteriosas e indirectas, normalmente acompanhadas de um número de telefone.
“Informa”
“Trata”
“Como novo”
“Bom estado”
“Um dono”
Esta é a linguagem de uma sociedade secreta que vive na clandestinidade, proibida de vender, esses donos de Opel Kadett, Fiat 127 e Citroën Visa por todo o país que procuram apenas uma oportunidade de melhorar a sua vida.
Segundo se diz, existe uma lei que proíbe que se ponha um carro à venda no meio da rua. Naturalmente, nada que impeça um português de vender o que bem quiser onde bem lhe apetecer. A proibição apela ao sindicalista em cada um de nós, aguça-nos a curiosidade e refina a imaginação.
Desde então, ninguém põe simplesmente o carro “à venda”, em vez disso põem o carro a tratar, ou dão informações sobre o carro. Às vezes apetece-me responder a um desses anúncios e pedir informações: que tempo vai fazer amanhã, onde fica a Rua do Rosário, qual é o número de telefone da Leitaria Saudade.
A minha teoria é que tudo isto é um boato que alguém lançou há muito tempo, e que hoje já ninguém tem coragem de pôr em causa. Por mim, tudo bem. Podemos continuar a brincar aos adultos, sempre ajuda o tempo a passar.
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